Acupuntura e câncer de mama
A acupuntura tem sido citada repetidamente na prática clínica como adjuvante nos cuidados oncológicos devido a sua comprovada eficácia em aliviar os efeitos colaterais do tratamento antineoplásico. Um repentino aumento de interesse nessa área iniciou em 1997, após ter sido estabelecido em consenso no National Institute of Health (NIH) Conference, que a acupuntura pode ser muito útil como terapia auxiliar no tratamento oncológico.
Vários centros de tratamento de câncer nos Estados Unidos já incorporaram a acupuntura como técnica complementar, dentre eles, Dana-Farber Cancer Institute (DFCI) em Boston, Memorial Sloan-Kettering Cancer Center em Nova York e M.D. Anderson Cancer Center em Houston. Relatos demonstram que há uma tendência dos pacientes com câncer a procurarem terapias complementares visando uma melhor qualidade de vida e de tratamento (48% a 83% dos pacientes). No caso da acupuntura, a taxa chega a ser de até 31%.
O mecanismo de ação da acupuntura envolve uma resposta do sistema neuroendócrino, através da estimulação do sistema nervoso periférico e central. No momento em que a agulha penetra na pele, ocorre a liberação de neurotransmissores opióides, como as endorfinas, e de monoaminas, como a serotonina. Estudos com neuroimagem como ressonância nuclear magnética funcional (fRNM), PET-CT e Eletroencefalograma (EEG) demonstraram o estímulo de áreas cerebrais específicas com o uso da acupuntura, dentre elas, o sistema límbico, amígdala, hipocampo, hipotálamo, entre outras, o que explica o seu efeito tão abrangente, inclusive, induzindo a uma sensação de bem estar e a uma mudança na percepção e tolerância à dor.
Numerosos estudos têm demonstrado o papel da acupuntura no alívio de náuseas e vômitos induzidos por quimioterapia. Surgiram também evidências da eficácia da acupuntura nos sintomas de neuropatia periférica induzida por quimioterapia (formigamento ou perda de força das extremidades), na dor e na fadiga relacionadas ao câncer, na xerostomia (boca seca) induzida pela radioterapia e nas dores articulares e musculares induzidas por inibidores da aromatase (uma classe de hormonioterapia).
Constata-se, ainda, o aumento no número de estudos para o tratamento da leucopenia/neutropenia (diminuição de defesas) induzida por quimioterapia. Com a acupuntura, parece haver a ativação de diferentes mecanismos de defesa, incluindo macrófagos, neutrófilos, estimulação de células natural killer (NK) e linfócitos e produção de imunoglobulinas.
O uso da acupuntura também está descrito no tratamento de sintomas muito comuns na rotina oncológica como: sintomas vasomotores (fogachos), insônia, ansiedade e depressão.
A acupuntura é um tratamento seguro, quando realizado por profissionais qualificados. Não há contra-indicação para sua aplicação durante o curso da quimioterapia, desde que respeitadas as normas de biossegurança, com o uso de agulhas descartáveis e antissepsia adequada (figura 1). Os efeitos adversos são raros e podem incluir: equimoses ou hematomas leves (as agulhas são ultra-finas), dor no local ou dor irradiada no trajeto de um nervo com sensação de dormência, hiperemia e prurido temporários na região agulhada. Cada aplicação dura, em média, vinte minutos. O ideal é que o tratamento seja mantido por, no mínimo, 4 a 6 semanas. Alguns sintomas requerem mais tempo para a adequada manutenção. Em muitos casos, sua utilização pode diminuir a necessidade de medicamentos ou o efeito colateral dos mesmos.
Figura 1 – Agulhas da acupuntura
No cenário atual, onde se busca, cada vez mais, uma Medicina Integrativa, visando minimizar a dor e o sofrimento durante o tratamento oncológico, a acupuntura vem para somar, visto que auxilia na redução dos paraefeitos e melhora a qualidade de vida dos pacientes.
Luciane Poletto Antunes
Médica mastologista com especialização em acupuntura
Porto Alegre, RS
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